Disseram-me uma vez que eu escrevia num “estilo intimista”.
Não tenho palavras para explicar o quanto odeio esta expressão. Nem sei
explicar bem porquê, mas odeio. Lembra-me gente pretenciosa (coisa engraçada, odeio sentir que uma palavra está mal escrita, nas "pretensioso" parece ser português do Brazil, portanto)...a dizer falsidades pretenciosas,
num bar pretencioso, num ambiente “intimista” (argh), à luz das velas. Não. Não
sou eu. Também já me disseram que eu tenho um “estilo confessional”. Não tenho
argumentos. Não escrevo nas virtualidades nenhum segredo obscuro que pudesse
confiar a um padre, mas também não confio segredos obscuros a padre nenhum. A
alma nenhuma. A verdade é que se há estilo a ser definido, o estilo é
egocêntrico. Sem desculpas (e não será isto uma desculpa? Diferencio sempre
desculpa de justificação e esqueço-me de que para a maioria das pessoas, as
duas são equivalentes). Escrevo para mim, de forma menos aberta do que faria a
um diário, mas para mim, de qualquer das formas. Se alguém ler e se identificar com
alguma coisa, óptimo. Se não, tanto faz. Tenho de ser egocêntrica a escrever
porque socialmente levo tanto tempo a ouvir os outros falar que não me sobra
tempo para dizer tudo o que quero dizer. E se sobrasse, muito do que me apetece
dizer não interessa verdadeiramente a ninguém, e eu sei-o.
Escrever é mais barato e mais eficaz do que psicanálise e
afins, e se nunca passei definitivamente para o lado negro, é sem dúvida à
escrita que o devo.
Mas… Mas recentemente, sinto-me cada vez mais perdida na
minha escrita. Não sei escrever quando estou “bem”. Escrevo para desabafar,
para cuspir para o papel tudo o que não posso efectivamente cuspir para a cara
de alguém, ou de deus. Mesmo quando escrevo sobre personagens fictícias, só as
sei construir ou iguais a mim ou o exacto oposto. Escrevo para me acalmar, para
tentar chorar sozinha em vez de em frente a toda a gente (raramente choro
sozinha. A pressão de não o poder fazer, por estar gente a ver e a julgar-me, é
o que me faz fazê-lo).
Agora, não sei sobre o que escrever. Continuo com mil medos.
Continuo com plena noção de mil coisas que podem correr mal. Mil e uma, vamos.
Mas mudei tanto que não sei voltar a pegar em nada do que a minha pessoa fez
antes de mim. Sinto-me como uma selvagem que foi levada para a sociedade e
passa os dias contemplando a sua imagem no espelho, fascinada. Será que toda a
gente fica tão abismada por ter mudado? Quer dizer, eu sempre soube que
eventualmente aconteceria. Que um dia quereria ser alguém com mais que fazer do
que chorar porque o A gosta da ex-namorada, ou o B nunca quis verdadeiramente
conhecer-me. Talvez a diferença seja que os outros me veêm finalmente como
responsável, como “estável”. E eu, que sempre me vi pelos olhos dos outros, não
preciso finalmente deles, mas concordo com eles. Sou estável. Sou saudável. Não
tenho piada nenhuma. Retenho um resquício do turbilhão que era, do turbilhão
que nenhum conseguiu amar, mas que amava eu, e eu também tenho de contar para
alguma coisa.
Infelizmente, isto não se traduz num escrito minimamente interessante, mas por muito que em tempos tenha adorado a melancolia e a desperança, hoje prefiro ser feliz do que interessante. Principalmente, e aqui vai o resquício, porque (quase) ninguém me achou suficientemente interessante para me querer fazer feliz.
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