30 March, 2010

C

É como chegar ao fim do filme e não ter percebido nada.

Perguntamos aos outros o que acharam, e todos perceberam as mensagens subliminares e as (pseudo?)filosofias abstractas. E nós não. Entramos na conversa, jogamos para o ar meia dúzia de ideias pseudo-intelectualmente seguras, e pode ser que ninguém desenvolva o assunto e veja que realmente, não percebemos mesmo nada do que acabámos de ver.

Sim, não é de facto agradável sentirmo-nos burros no nosso círculo de intelectuais emproados. Também não é agradável admitir que só lhes chamamos emproados porque temos inveja. Queremos tanto fazer parte de algo. Mas não de um algo qualquer, só porque sim. Só pelo sentimento de pertença. Não. Queremos fazer parte de algo que amamos, algo em que sempre quisemos ser inegavelmente bons. Que fazer quando chegamos à conclusão de que talvez não sejamos? Admitir e sair pela porta dos fundos com umas orelhas de burro e a cabeça baixa, ou bater o pé e ver o filme 20 vezes, sem ninguém saber, até os estores se abrirem e virmos o que para os outros é óbvio?

Lembro-me de Mulholland Drive, talvez porque encaixa neste maldito turbilhão de coisas que não fazem sentido nenhum. Toda a gente percebeu o filme. Eu não. Nem à 1ª, nem à 2ª, nem sequer à 5ª vez. Disseram que o David Linch faz os filmes mesmo para ninguém perceber, mas os outros perceberam tudo. Ou se calhar fazem o mesmo que eu, fingem para ninguém saber que não fazem o mínimo sentido de nada daquilo. Talvez ninguém perceba nada de nada. Se calhar apelam à subjectividade de (quase tudo) para darem uma interpretação qualquer, só para haver alguma.
Mas talvez tenham percebido mesmo à 1ª, ou tenham visto o filme 20 vezes em casa antes de chegar lá. Cada um tem o seu ritmo, e não posso querer à força toda ser uma espécie de génio em abolutamente tudo. Muito menos em coisas abstractas.
Não é justo nem saudável compararmo-nos constantemente aos outros, muito menos quando fazemos questão de nos orgulharmos de ser diferentes. Mas podemos aprender alguma coisa com os outros. Podemos talvez deixar-nos de lamentos infrutíferos, deitarmo-nos com um balde de pipocas e recusarmo-nos a desistir enquanto não tivermos finalmente chegado lá.

Nem que seja à milésima vez.

1 comment:

Sara said...

Isto é um comentário superficial mas ninguem percebe David Lynch. Que eu conheça. Que eu saiba. Mas eu achei agradável ser confundida pelo senhor.